sábado, 13 de novembro de 2010

Penúria

E de pensar que deixo, meio que amontoado, um sentimento bonito ser recolhido e posto num saco preto de lixo orgânico - não me venhas dizer que amor é vidro cortante ou resto de papel, amor remexe a terra e sabe florescer. E de pensar que desperdiço tão bom parzinho para completar comigo as palavras cruzadas. Machuca. É inviável abrir mão de alguém, principalmente quando a paixão ainda pede rituais antigos de aproximação. Teu corpo era bom de fazer cafuné. Minha mão tem perdido o jeito até pra abrir a janela pela manhã. Nosso fardo, contudo, é leve. Buscas em mim só o andar trôpego de quem lamenta, ao que revelo - a teus amigos - risos sinceros e desapegados. Queres que eu padeça, pagando caro por ser a cigana dissimulada outrora narrada em Capitu. Tu não és Bentinho, não podes matar em mim o que mais é vivo: os olhos. Por isso é que, ligeiro, corres desses olhos que exalam a vontade de atar-te os braços. Desejas um apelo justo por saberes, também, que amor não se atira a um vento bravio. Mas calam teu coração à medida que tiram meu nome da cabeça que é teu guia. Não por isso permiti que tanto tanto atirasses pedras de adeus. Reconheço a vastidão do sentimento e ando meio apegada a ele. Aquela pontinha do imenso jurado a nós é tentadora. Já nem posso, todavia, aconselhar que sejas meu e que corras, voes, transcendas até meu colo. Porque tua cabeça é mais dura do que a minha. Porque não chegaste a crescer diante da presença querida. Não nos unimos em segredo, embora fosse a coisa mais linda do mundo. Será que esperas por algo?
A falta de explicação comprime meu peito virgem e, num instante, me ganhas logo outra vez embrulhada de presente. Jogas quilos de fita no latão do lixo. Tu perdeste a noção. Ignoras saber que vou embora; pois que fujo, impossível achares um pedacinho, que seja, de embrulho. Não me tens como teve, ledo engano. Terás agora um bilhete: enternecedora é a hora da partida. Há de vir um tempo em que sonharás com um par de olhos colados àquela boca que te fazia dormir. Há de sentir o peso da falta, e teu fardo não mais será brando. Há de queimar tuas mãos. Jogaste fora um bocado, mas eu me colo. Poderás, enfim, colar-te em mim?

2 comentários:

  1. Sem palavras. Lembro-me de um passado distante. Sua voz fala o que já não deveria ser dito. Dói como a certeza de que é a última vez que falamos. Sem palavras. Apenas leio, leio,leio, mas ler já não basta. Quero mais. Como se fosse renascer da tormenta num impeto de lucidez.

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  2. Cadê o próximo post? Você anda muito preguiçosa. E aquele papo de "nada substitui o bom e velho léxico" hein? Você tá escondendo o seu léxico da gente... ashuashasuash

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