sábado, 19 de março de 2011

19.03.2011

Como caminhar provavelmente não adiantaria e correr atrás de algum subterfúgio mediano, ou do rompante, parecia querer acreditar demais, meu corpo alcançou somente a cama. Deitar-me, recluir-me, pausar, tão somente, a ação penosa e dramática decorrente da solidão. Estaria eu menos sozinha, por acaso, naquela cama? Não é esse o ponto. Acontece que, num arroubo egoísta e igualmente solitário, o cerco das pessoas me enfurnou numa poluição mental pior do que o velho estado consciente de mim, dos meus antigos sacos de mofo. Humilhação maquiada em meios-tons e respostas enviesadas. A dificuldade na comunicação: diz-se gritado, lê-se muita prosa psicológica, afasta-se do bem. O bem não é nada além do cuidado. Mas essas pessoas estão profusamente lotadas de merda na cabeça. Carentes, cínicas, rejeitadas - umas pelas outras. E citam Caio Fernando Abreu, atropelam Clarice Lispector. É muito fácil ler meia dúzia de linhas de algum conto e estampar "como me dói viver". Ninguém entende nada de dor, manipulando, com membros toscos, historinhas piegas. Se choro e "me dói viver", também faço parte da onda de carência/cinismo/rejeição geral. Eu só não destruo a vida de quem gosto, voltando cinco minutos depois com fumaça cobrindo os olhos, olhos podres que não têm mais pálpebras. Já faz tempo que não encontro olhos que possam se fechar, serenos. Gente prepotente se esfregando enquanto um líquido morno escorre dos corpos; onde está a grande felicidade das pessoas? É uma falta de assunto assustadora, uma preguiça mordaz de conhecer o interior das coisas, abandonar a crosta. Ataques de pânico, sonhos confusos e horas desconfortáveis na cama me arrastam pra essa coisa louca que sou eu. O movimento pungente, prolongado pela memória que não deixa mentir, rasga a carne. Fico cada vez mais fraca, choro por pouco, choro por muito. Mas não deixo de querer um outro tipo de pessoas, as que não caminham nem correm pelo rompante, as que, por resistirem, endurecem. Essa cama quente não me deixa mentir.