terça-feira, 12 de abril de 2011

Lembrança

Tentei de tantos jeitos me fazer presente - seu presente. Das palavras que eu não sabia que guardava, até das surpresas que o tempo plantaria aos poucos. Dos seus olhos tão azuis. Do menino que eu esperava crescer. Hoje você tem a minha idade. Não há desculpas. Hoje você ganha presentes mais caros do que uma palheta nova ou uma calça de cor engraçada. O mundo vem abraçar suas costas com queloide, você está feliz. Como faço pra suportar a tal felicidade que, por tudo, me exclui? Eu sou uma caixa esquecida na chuva. Você perdeu a presença daquilo que não se vende em lugar nenhum: meu coração. Daí meu desejo era o de ficar muito, muito brava e apagar o que ainda me deixa fácil. Mas ignoro, já que o menino que conheci me fez chorar no primeiro beijo. Me deu uma bala que eu pensava não existir pra vender mais. Tinha dentes chatos que não podiam direito com a cafeína do chá, por causa do clareamento. O menino do banco do shopping pra quem eu contei que acreditava em extraterrestres. O menino que não fez a barba porque eu pedi pra me fazer cócegas com o atrito. Isso não tem nada a ver com escrever. Isso é porque eu não vou ser capaz de esquecer, mesmo não querendo você como homem. O moleque da minha idade é só um rosto. Você, aniversariante forasteiro, foi a personificação dentro de mim de algo que, um dia, Nietzsche falou: ama-se mais o desejo do que o desejado. Eu amei minha história inserida dentro do seu cotidiano. Nos encaixamos, pueris, muitas vezes a quilômetros de distância. Agora você é letra, e não rima. Você é uma pontada que dá na espinha quando a vida me tapeia e traz sua voz cantando algum verso antigo, lembrança. Você é o que é, não o que ficou em mim. Hoje, quase por acaso, é seu aniversário.

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